"Mas não perguntem nunca porque escrevemos: não
há resposta para essa pergunta. Escrevemos como outros
pintam, outros fotografam, outros filmam, outros compõem
música. Porque está lá: porque está ali uma imagem
e nós fotografamo-la; porque está ali um som e nós
transformamo-lo em música; porque está ali um texto e
nós escrevemo-lo. Não sabemos nunca como estas coisas
nascem e de onde vêm; sabemos, às vezes, para onde
vão e como irão, conduzidas pela nossa mão; mas não
sabemos porquê: porquê connosco, porquê agora, porquê
desta maneira e não de outra? Alguns tentam explicar
isso pela compulsão, pela necessidade irresistível,
pela vocação, talvez. Eu não sei dizer: sei apenas olhar e
sei que, olhando, olhando sempre, vendo o que merece
ser visto, eu hei-de escrever — porque quem viu deve
testemunhar. Eu sou uma testemunha, um contador de
histórias, um homem que passa a palavra. E, ao passá-la,
ao contar tudo o que vi, vivo duas vezes".
Miguel Sousa Tavares in Não Se Encontra o Que Se Procura
Miguel Sousa Tavares in Não Se Encontra o Que Se Procura
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