começar tão bem o dia


Desde o dia em que nasceram amo incondicionalmente a Sara e a Tristana que hoje fazem anos.
Simplifica-se muito quando se diz que se amam os filhos mal se olha para eles. Assim o mérito parece todo dos pais: são eles que amam mesmo quando os bebés, oportunistas, apenas têm uma vaga ideia que precisam dos pais.
A verdade é muito mais bonita. A verdade é que os pais amam os filhos porque se apaixonam por eles porque os filhos fazem-se amar, tornando-se irresistíveis.
Os filhos desapaixonam-se dos pais. No princípio os pais são as únicas pessoas no mundo; depois são, brevemente, as melhores. Segue-se uma lenta desilusão que, com a adolescência, dói como um barrete de um bebé enfiado à força na cabeça de um vil guerrilheiro de treze anos.
Depois, se nos portarmos bem e tivermos sorte, lá se reconciliam a amar-nos, muito teoricamente, com muitos protestos e poucas demonstrações.
Já os pais, à medida que vão conhecendo as pessoas que são os filhos, tanto se podem apaixonar como desapaixonar-se. Depende dos filhos. A verdade da vida, quase nunca dita, é esta: a culpa é dos filhos.
Eu sou muito mais pai da Sara e da Tristana do que elas são minhas filhas. Não é tanto o substantivo como o pronome. E amo-as muito mais do que elas me amam - mas só porque é impossível amá-las menos. Pelas pessoas que são. Cada vez mais me apaixonam mais.
Embora elas também sejam - é preciso dizê-lo - as melhores filhas que algum pai de merda já teve.

Miguel Esteves Cardoso in Público, 21 de Janeiro de 2016

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